SEM PALAVRAS

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2006-08-12

"PORQUE HOJE É SÁBADO"

O título é de um poeta Brasileiro, Vinícius de Moraes, que cantava mal e bebia bem, que morreu atrapalhando o trânsito, deixando um vazio nunca mais preenchido. Um pouco como o nosso Ary dos Santos, com a grande diferença de nunca, que eu saiba, ter cantado.

Porque hoje é sábado levantei-me mais tarde, fui ler para o café (hábito dos tempos de estudante?), almoçámos com um casal amigo, estivemos a ouvir os U2, fomos tomar uma bica, ver as fotos que já tiraram das férias, despedimo-nos que eles queriam continuar as férias e nós ficámos os dois. Temos tempo, hoje só foi o primeiro dia do fim de semana prolongado.

Agora é hora de ouvir a Diana Krall, escrever, ler o que outros escreveram e , provavelmente, ver um filme na TV.

Deuses, dái-me tempo; não me esqueci do que vos prometi ontem.

2006-08-11

GRAÇAS AOS DEUSES É SEXTA-FEIRA

Finalmente. E um dia de férias, metido no dia 14, faz-me sentir no Pólo Norte a olhar o Mundo aos meus pés e as guerras a não passarem de disputas de formigas no carreiro.

Hei-de regressar à realidade, prometo a todos os Deuses, mas, até lá, deixem-me sonhar. Deixem-me ficar só com a Isabel, com os amigos, que são tão poucos, e com os gatos que me conhecem as manhas.

Deixem-me levar a ilusão o mais longe possível. Prometo-vos uma adoração especial do sol na primeira oportunidade.

2006-08-10

"QUANTO MAIS QUENTE MELHOR", LEMBRAS-TE?

O calor era tanto que eu ouvia e via as rochas a estalarem. O barulho parecia o de um animal moribundo (a matança do porco?), um som agudo e prolongado. A visão era estranha: nunca tinha observado uma rocha, não um calhau, nem uma pedra da calçada, mas um mineral sólido do tamanho de um carro, a dividir-se como se tivesse sido atingido por um raio.

Mas outros fenómenos depressa chamaram a minha atenção: o asfalto das ruas parecia manteiga e os pneus de alguns carros fundiam-se com o alcatrão. As andorinhas voavam em círculos, mais como aves de rapina do que como pássaros que faziam da arte de voar um espectáculo. Os cães, com a língua de fora, corriam sem destino e sem uivar. Um gato juntou-se a eles.

Não se via nenhum ser humano, excepto os que ficavam presos nos carros e que não se atreviam a saír. Um incêndio deflagrou, espontâneamente, no que eram umas flores do jardim. Propagou-se ao resto, primeiro o mundo vegetal, depois a tudo o que podia arder. E, para minha surpresa, eram todas as coisas. Tudo era combustível.

Foi quando acordei e corri à janela. Não vi incêndios, mas não consegui voltar a adormecer. Este calor está a dar comigo em doido.

2006-08-09

O GATINHO

O calor continua a apertar comigo. Logo de manhã, ainda meio ensonado, oiço um palerma dizer na rádio que o tempo excelente, magnífico, ia continuar. O gajo deve ter ar condicionado na BestRock. Ou, então, como nunca está calado, faz corrente de ar. Está na altura de mudar de emissora.

Saí da escola por volta do meio-dia e meia. Tinha combinado ir almoçar com um amigo e não queria que ele tivesse que esperar por mim à soleira. Que por ali não há sombras, só pó e calor. Quando me estava a abrigar do sol e a colocar-me num ponto estratégico para o ver chegar, oiço um gatito a miar. Olho para as plantas, dentro da escola, junto ao portão, e aparece o bichano todo preto, com uma fita ao pescoço. Respirei aliviado. Não devia ser abandonado. Quem abandona os animais dá-se ao trabalho de lhes tirar tudo o que os possa identificar. São filhos da puta que cheguem para condenarem a uma morte quase certa, o animal que teve o azar de confiar neles, mas nunca se esquecem de tirar todos os possíveis identificadores.

Bem, o pequeno felino deu uns saltitos e ficou a olhar para mim, como quem diz "E agora?". Isso pergunto eu, pá! Que faço de ti? Ficares na escola, em tempo de férias, era dar-te abrigo, água que sempre corre de alguma torneira, mas onde arranjar comida? Além do mais, se ele não era abandonado, devia ser dali perto.

Atravessei a rua. O gajo seguiu-me. Com todo o à vontade só possível num mamífero jovem. Na entrada de um prédio, sentei-me nos degraus, à sombra. Ele acompanhou-me, mas deitou-se ao comprido, para aproveitar o máximo de frescura. Aquele prédio ainda não estava habitado, portanto ele não era dali. Levantei-me e dirigi-me à esquina mais próxima, que dava para uma rua já com moradores. Ele foi atrás de mim, como cão ensinado. Quando cheguei à esquina parei a ver se aparecia alguém com caro de dono do gato ou se ele reconhecia a zona e se dirigia para alguma porta.

Foi quando vi chegar o meu amigo à outra esquina. Assobiei com força para lhe chamar a atenção. Ele não deu sinal de me ter ouvido, mas o gatinho assustou-se e foi disparado rua fora até uma porta por onde desapareceu.

Quero acreditar que era ali a morada dele. Quero crer que os donos estariam à espera ou à sua procura. Quero um final feliz. Porque fui almoçar e não me lembrei mais do bicho. E não quero ter, agora, a minha consciência a levantar-me dúvidas.

2006-08-08

E O CALOR? SENHOR! O CALOR...

Levantei-me, espreitei lá para fora e fui a correr abrir as janelas todas. O céu estava fechado, mas o ar era fresco. Senti-me bem e respirei fundo. Um cheiro irritante, mas que me trazia à memória sensações agradáveis, baralhou-me. Depois, lembrei-me: era o da celulose de Setúbal. Há muito tempo que não o sentia. Há muito tempo que não vinha vento de sul. E este vento era fresco, vinha do mar, trazia chuva no ventre. Mas este era, somente, fresco. O que já era muito para os dias quentes que teimavam em durar.

Ao meio-dia já o cheiro tinha desaparecido da vila. O sol e o calor tinham ocupado o seu lugar.

E, com o subir da temperatura, subia a irritação. Por tudo e por nada. Comigo, a simpatia derrete-se acima dos 30 graus. Hoje esgotei-me em suor. Não há mais nada.

2006-08-06

ANGÚSTIA

Esta angústia de Domingo à tarde acompanha-me desde que me lembro. Primeiro com a escola, agora com o trabalho.
Já lá vão tantas vésperas de segundas-feiras que este incómodo, que não é de ferida, já podia ter desaparecido. Será que na minha memória não existe nenhum início de semana alegre quanto baste, para eu ter a esperança que se possa repetir?
(Pausa para pensar e ouvir Ella Fitzgerald)

Não me recordo de nenhum. Mas deve ter existido. De certeza que um, pelo menos, aconteceu. Vou ter esperança que amanhã se repita. Escrevo e quero acreditar nisso.

Quero acabar o fim de semana, se não como se fosse sexta-feira à noite, pelo menos como Sábado à tarde.

A Primeira

Não vou estar a dizer quem sou ou como sou. Este é um mundo de ilusão e, facilmente, poderia escrever o que me apetecesse. Deixemo-nos disso. Se alguém por aqui passar, terá que ser através dos textos que formará uma opinião.

Se alguém por aqui passar... É uma contradição. Por um lado penso desejar não ser lido por ninguém. Mas, então, para que é criei um blog? Porque tenho esperanças de lerem o que escrevo, claro, mas, mais do que isso, que parem um segundo e pensem "Aqui está um gajo porreiro. Se calhar, vale a pena perder uns minutos por aqui."

E se escreverem algum comentário, que o façam sem a sensação de estarem a perder tempo, a cumprir uma formalidade, a praticar um ritual ou a fazer um favor ao gajo. Prefiro ficar desconhecido o resto da eternidade e mais um dia.

Eu começo hoje. Não sei quando acabarei.