SEM PALAVRAS

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2006-09-30

PARALELAS ASSIMÉTRICAS

Houve uma época em que a conversa e os silêncios fluíam sem constrangimentos. Os dois pressentiam o que cada um esperava. Não havia necessidade de grandes explicações. Entendiam-se e compreendiam-se. Bastava-lhes.

A não necessidade de explicações deixou uma dúvida instalar-se. Ganhar volume. Tornar-se possessiva. Transformá-los. Quando começaram a sentir os silêncios as palavras já não eram suficientes. E encontraram portas fechadas onde nunca tinha havido paredes. Afastaram-se.

Um ritual permaneceu. Com desconhecimento de ambos. Jogavam sempre quatro euros no euromilhões. Dois para cada um. Sempre os mesmos números. Sem pensarem, continuaram a fazê-lo. Onde tinha havido uma vida partilhada, passou a existir uma série de números em comum.

Um dia tiveram que ir levantar um prémio. Cruzaram-se. Um ia já a descer, o outro a subir. E houve um momento infinito em que os olhos se fixaram nos olhos, em que a interrogação pairou na memória que tinham do outro, à procura de uma resposta. Não a acharam. Não perceberam que o medo era uma novidade que desconheciam existir neles. E o movimento de separação continuou. Ele perdido nas escadas e ela a perder-se na multidão.

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